Por: Ítalo Amorim
Que o Wolverhampton atravessa um grande momento todo mundo sabe, porém todos conhecem o motivo desta ascensão?
Para entender o “boom Wolves” temos que voltar um pouco no tempo, mais precisamente para julho de 2016, quando as coisas começaram a mudar para os lobos. Vamos contextualizar:
Passada as temporadas 14/15 (quando o time ficou perto dos playoffs) e 15/16, os Wolves tinham dado a impressão que se estabilizariam como uma equipe mediana - após o rebaixamento (temporada 12/13) para a LeagueOne (terceira divisão inglesa) e o retorno imediato na temporada seguinte (13/14) - entretanto isso começou a mudar na transição da temporada 15/16 para a 16/17.
Na época, o conglomerado chinês FosunInternational efetivou a compra do Wolverhampton e deu uma sobrevida para a equipe. A primeira temporada foi um fracasso, o time conseguiu ir pior do que na temporada anterior e ainda sofreu um real risco de rebaixamento, porém foi apenas um mau começo.
Para a temporada 17/18 os donos do clube resolveram investir com maior força e é aí que começamos a entender o modelo da equipe.
Para aquela temporada a principal aquisição foi para o banco de reservas, mais precisamente para o comando da equipe, Nuno Espírito Santo chegou e foi o pingo que faltava no “i” chamado Wolverhampton.
O português de 45 anos chegou com certo status ao clube, já havia treinado o Rio Ave (Portugal), Valencia (Espanha) - onde chegou a ficar na quarta posição na La Liga 14/15 - e, posteriormente, o Porto (Portugal).
Pronto, essa introdução foi necessária para entender o que vem a seguir: o time da atual temporada é reflexo de um projeto que vem sendo construído.
Primeiro vamos para a Championship 17/18, temporada em que os Wolvesconseguiram o acesso para a Premier League e o título da segunda divisão inglesa.
MODELO DE JOGO – 17/18:
- FORMAÇÃO:
A equipe se portava em uma 3-4-3, variando defensivamente para uma 5-2-3: J. Ruddy; Bennett, Coady e Boly; Doherty, Neves, Saïss e B. Douglas; Ivan Cavaleiro, Léo Bonatini e D. Jota. Para a 5-2-3 os alas (B. Douglas na esquerda e Doherty na direita) recuavam fazendo o papel de um lateral/ala-defensivo.
Em questão de plantel inicial, pouco se mudava desse time base. H. Costa era o 12° jogador do modelo (sempre entrando no lugar de um dos pontas); R. Miranda entrava quando necessário na defesa, a maioria das vezes substituindo o Bennett e N’Diaye ao lado do Gibbs-White eram as opções para povoar o meio-campo - sendo o primeiro visando um time mais defensivo e o segundo visando uma equipe de passe melhor -.
- MOMENTO DEFENSIVO:
O time se defendia por meio de zonas de marcação, criando quadrados e triângulos entre seus homens de defesa. A partir do momento que o time adversário infiltrava uma dessas zonas a equipe se portava para pressionar o espaço, recuperar a bola e sair o mais rápido possível para o contra-ataque (também com quadrados e triângulos). Exemplos:
EXEMPLO PELO LADO DEFENSIVO ESQUERDO:
Captura de tela retirada do canal do Wolverhampton e editada por @italoamorim08.
EXEMPLO PELO LADO DEFENSIVO DIREITO:
Captura de tela retirada do canal do Wolverhampton e editada por @italoamorim08.
- MOMENTO OFENSIVO:
A saída para o momento ofensivo ficava sob responsabilidade de C.Coady, que normalmente recebia a bola do goleiro em uma reposição/tiro de meta ou quando a jogada da equipe não avançava e o time se via na obrigação de retornar o jogo.
Os demais defensores (Boly e Bennett) abriam o jogo e serviam como opção para uma transição rápida na lateral ou rotação do jogo em caso de pressão adversário.
Na linha de meias-centrais, Saïss e Neves possuíam a função de aprimoramento do passe em uma espécie de saída apoiada, sempre com alto volume de atletas por dentro (Saïss, Neves, B. Doulgas/Doherty e D. Jota/I. Cavaleiro ou L. Bonatini), normalmente os homens de meio recebiam a bola dos zagueiros e buscavam triangulações (ponta do seu lado + ala do seu lado ou ala do seu lado + o outro meia-central).
No ataque ocorria uma variação:
Primeira situação: L. Bonatini recuava como falso-nove os pontas (D. Jota e I. Cavaleiro) atacavam o espaço vazio.
Segunda situação: os pontas recuavam e um dos alas (B. Douglas ou Doherty) se aproximava da referência ofensiva (L. Bonatini), criando uma espécie de 4-1-3-2.
A primeira situação era a mais habitual, sempre com alto volume de atletas, a segunda trazia um modelo habitual quando o time buscava segurar o resultado, diminuindo assim o seu volume ofensivo.
Exemplo (recuperação e construção).
No vídeo vemos a seguinte situação: Ojo (ponta do Fulham, adversário nessa partida) parte em direção à área do Wolverhampton, ele entra na zona de marcação do time e rapidamente perde a bola.
O Wolverhampton tem êxito na marcação e inicia a jogada de contra-ataque. A bola já recuperada chega em Coady, dessa vez mais avançado como uma espécie de líbero.
Com campo, ele conduz a bola e encontra I. Cavaleiro (que aproveita o espaço deixado por L. Bonatini, já como falso-nove). Esse avança, tenta inicialmente a finalização e no segundo momento assiste D. Joga (que acaba errando a finalização). Ao todo, a jogada passa pelos pés de seis atletas.
Entendido o time da Championship, vamos entrar no atual Wolverhampton.
MODELO DE JOGO – 18/19:
Para a atual temporada os lobos foram pontuais: contratar em definitivo quem deu certo e era empréstimo (Diogo Jota, Léo Bonatini e Willy Boly) além de contratar nomes titulares ou opções melhores para jogo (Rui Patrício, Rúben Vinagre, Raúl Jiménez, João Moutinho, Adama Traoré, LeanderDendoncker e Jonny Castro, esse último na janela de janeiro).
Os investidores abraçaram o projeto e financiaram os nomes solicitados por Nuno. Dos contratados, o único que não ganhou titularidade foi Adama Traoré, que viu do banco Diogo Jota evoluir consideravelmente sobre o comando do português.
- FORMAÇÃO:
O time já se porta estruturalmente diferente, vemos uma 3-5-2 com quatro peças diferentes do time que conquistou a Championship.
Quanto a reservas temos também opções principais, na frente I. Cavaleiro é a peça que normalmente entra no lugar do D. Jota ou até do Raúl Jiménez e nas alas H. Costa é o nome que aparece quando o time precisa avançar e R. Vinagre quando o time precisa aproximar as linhas. Na parte defensiva a única mudança mais comum é a entrada do J. Ruddy em alguns jogos da temporada.
- MOMENTO DEFENSIVO:
Ignorando os números (que Nuno não gosta nem um pouco, por sinal), vemos a mesma ideia de jogo sendo implantada: zonas de marcação (dessa vez com quadrados mais bem definidos: Boly – Coady – Bennett – R. Neves por dentro, Boly – R. Neves – J. Moutinho – J. Castro pela esquerda e Bennett – R. Neves – L. Dendoncker – Doherty pela direita).
Já em estrutura vemos uma mudança: o time ganhou um atleta por dentro. Defensivamente isso implica em reposições mais bem definidas quando os alas avançam (Dendoncker repondo o Doherty e R. Neves repondo o J. Castro), além de um primeiro bote por dentro logo no primeiro momento.
Em pouco mais de 30 segundos vemos a ideia se repetir por três vezes, o time oferece um espaço ao adversário até o momento que o mesmo entra na zona de marcação (a pressão aumenta e a marcação duplica). No lance do vídeo a equipe tem êxito nesse controle de espaço, jogando a bola para a linha lateral.
- MOMENTO OFENSIVO:
Ofensivamente também vemos efeitos da mudança estrutural, com três nomes por dentro os alas passam a ter liberdade para explorar o corredor (3-3-4) e o time ganha nas finalizações do elemento surpresa (antes característica exclusiva do R. Neves).
Essa mudança foi um “detalhe”, apenas um aprimoramento da ideia de jogo, as triangulações com o zagueiro + meia + ala foram mantidas e os homens de frente ganharam mais espaço no último terço do campo. Esse espaço no último terço ajudou consideravelmente Diogo Jota e principalmente o Raúl Jiménez, grande nome ofensivo do time até então.
Vídeo: canal do Wolverhampton.
Coady, com espaço, lança para Hélder Costa, esse erra o domínio e vê a bola chegar em João Moutinho após um bote errado do adversário.
O português levanta a cabeça, percebe a infiltração dos dois homens de frente (liberdade no último terço) e lança Cavaleiro, o ponta assim como no jogo da Championship faz a leitura do lance e visualiza um atleta ao seu lado, dessa vez o Raúl Jiménez, que com mais espaço finaliza e marca. Nessa jogada a bola passa pelos pés de cinco atletas.
Dois lances, duas construções da defesa ao ataque, dois lances que surgiram por meio de triangulações e que encontraram o mesmo nome: Ivan Cavaleiro, essencial para os minutos finais da equipe.
- MODELO SURPRESA:
Captura de tela retirada do canal do Wolverhampton e editada por @italoamorim08.
Outro modelo de jogo usado algumas vezes por Nuno é o 3-3-4/4-2-4, prendendo os laterais do adversário e ganhando meio-campo para suas triangulações.
A qualidade de passe dos meias-centrais e a velocidade dos alas facilita esse tipo de movimentação (principalmente nos contra-ataques, quando o corredor do time fica livre).
Por mais que não seja habitual o modelo sempre surge como opção em partidas contra os principais times da liga (visando assim surpreender o adversário).
Segundo o próprio Nuno, a ideia é manter seu time sempre nos últimos 65 metros de campo (mesmo que sem a bola), porque assim sempre estará próximo do gol.
Acho que no final de tudo os Wolves se resumem a uma palavra: organizados. Conceito vago? Talvez, mas procurei muitos termos para definir o Wolverhampton de Nuno Espirito Santo e esse foi o que melhor se aplicou. O time tem a ideia bem projetada e consegue replicar isso dentro do campo de jogo.
A postura que permite um time que defende e ataca quase que simultaneamente, as peças que oferecem variações de modelo sem perder a característica e o estilo de jogo capaz de surpreender até os principais times da liga… no final acho que “organizado” é um termo simples como o Wolverhampton sempre optou ser.
Vídeo: Beanyman Sports (edição: @italoamorim08/VivaVideo).